sexta-feira, 10 de setembro de 2010

A fé acima do racismo

Superação, fé e perseverança são  fundamentais para o pastor, que é negro, da Igreja Universal do Reino de Deus, Luiz Cláudio de Almeida. Ele faz um trabalho de inclusão social com jovens marginalizados e excluídos da sociedade, dando-lhes a oportunidade de recomeçar a sonhar.
Acompanhe na íntegra a entrevista, em que ele conta suas experiências como pastor e os projetos realizados enquanto esteve no RS.
 Hoje ele cuida de jovens em Portugal e em parte da Europa.

Luiz Cláudio de Almeida – Jornalista e pastor responsável pelo Força Jovem da Igreja Universal

Blog Negro na Mìdia RS: Em que ano iniciou o trabalho do Força Jovem na Igreja Universal do Reino de Deus do RS?
Pastor Luiz Cláudio: Foi em 2002 
Blog:Considera que faz um trabalho diferente dos demais estados ou países, quando foca a questão racial em seus eventos no FJ?
Pastor:Considero sim o trabalho que fiz diferenciado dos demais colegas de trabalho. Quando todos focavam a questão espiritual apenas, eu empreguei o trabalho social e de conscientização sobre a questão racial (etnias); até porque sou descendente de africanos. O trabalho ganhou corpo e forma que conseguimos montar um grupo base para sustentar todas as ações que realizávamos: Caravana da Solidariedade do Movimento Jovem Cidadão (corte de cabelo afro; aferição da pressão cálculo de massa corpórea, verificação da taxa de glicose no sangue, palestras nutricionais, orientação jurídica, encaminhamento de documentos novos, aplicação de flúor, palestras sobre acepcia bucal e etc. em meio a apresentação de grupos de b-boys, rappers, grupo de pagode local, grupo mirim de bailarinas de comunidade e por aí vai), formação de Biblioteca Comunitária, aulas de Inglês para jovens carentes, formação de turmas em Informática (dentro de comunidade), oficinas de Hip Hop, formação de coral na FASE e bate papo com os detentos e dias de visitas fazíamos uma festa com teatro, show com o Rapper DÚ, distribuição de salgados e doces, distribuição de alimentos em frente ao Mercado Público e parcerias com universitários para dar as horas extra curriculares e com o programa Hip Hop Sul, da TV Educativa na época.
Tudo isso passou a ser copiado pelos outros líderes para implantar em seus estados, sendo que alguns aprimoraram mais a idéias fazendo grandes eventos, em especial o líder do Rio de Janeiro da época.
Blog:Acha que existe racismo dentro da igreja ?
Pastor:Isso não é aceito e tão pouco ensinado pelos pastores. Sem falar que a Bíblia condena totalmente isso. Se existe é por parte daqueles que não querem seguir os ensinamentos do Mestre dos mestres: Senhor Jesus. 
Blog:Durante os cinco anos que esteve aqui no RS, o senhor viu dificuldades de tratar sobre a temática do negro?
Pastor:Na capital, muito mais pelo próprio negro do que pelo branco. O negro livre traz o cativeiro dentro de si e não pode. Acha que o elemento branco é superior e ele mesmo não é mercedor de absolutamente nada. Dá a sua vez, não por educação ou cavaleirismo, mas porque tem medo ainda. Está dentro do seu inconsciente.
Agora no interior do RS, sim encontramos o preconceito ainda latente nas pessoas. Por materemos um as tradições européias, muitas cidades sulistas ainda falam o dialeto alemão (por exemplo) seus membros são muito brancos e veem com maus olhos uma pessoa morena. 
Blog: E aqui no RS vê a discriminação de forma mais acentuada do que nos outros Estados?
Pastor: Não. Porque o interior catarinense e paranaense também são preconceituosos. 
 Blog: Quais as atividades que o Força Jovem realiza para agregar esta etnia na IURD?
Pastor: O esporte, que é a porta de entrada para o Força Jovem sempre uniu e continuará unindo as etnias. Exemplo disso foi o filmo "Invictus", com Morgan Freeman que mostrou a estratégia de Nelson Mandela, entã presidente da África do Sul, em apoiar o Rugbi (considerado esporte de branco) de sorte que a a integração do time com o país fez brancos e negros torcerem e se abraçarem em função do esporte.
O Força Jovem segue essa linha. Temos o karateca, Juarez, do Rio de Janeiro, medalhista de ouro do PAN. Todos (brancos e negros) do país e do Força Jovem torciam e se alegraram com a vitória dele. O preconceito é quebrado mais uma vez pelo esporte.
A música também é outro instrumento de união. Ninguém tem vozes tão bonitas quanto os negros. Montando grupos, duplas, trios e etc. jovens desenvolvem seu potencial musical e arrastam outros tantos na torcida, independente da cor. 
Blog:E já foi discriminado por ser negro e pastor?
Pastor: Já. Na IURD de Pelotas (vejam só, um dos maiores redutos de negros do RS) fui chamado de negro por uma mulher que estava vendendo coisas dentro da igreja. Pedi pra parar, mas ela ficou revoltada e se pos a gritar comigo, chamando-me de negro, como se fosse uma ofença, disse pra ela que isso eu já sabia desde que me vi no espelho e tenho muita honra.
Agora como pastor fui muitas vezes mesmo. As pessoas não podem ouvir que vc é pastor, pois te olham de cima em baixo e ficam a fazer pouco de vc. Não é fácil. Tem de ter muita certeza do que vc quer e está fazendo.
Lembro-me do evento que fiz no estádio do Serejão, em Taguatinga, no DF: Nação Livre Festival, o maior evento contra a discriminação. Ninguém acreditou que conseguiria. Fui de porta em porta pedi apoio e nada. Até no Ministério da Cultura, com Gilberto Gil a frente e nada novamente. Com muito custo, faltando pouco pro dia marcado consegui com o GDF a verba. Foi um scuesso! Até a embaixada da República do Camarões esteve presente representando todas as demais embaixadas do continente africano. Tivemos participação de cantores de música black (Fat Family; Marquinhos Gomes; Rapper Tina; Rapper Dú; Provérbios X; o quarteto FLG e outros); coral com a música África em zulu, do senador Marcelo Crivella; leitura de uma parte do discurso de Martin Luther King (I have a dream...)  e um show pirotécnico de 7 minutos. Jovens de diversos lugares, quilombolas e cuirosos compareceram. enfrentei muita dificuldade por parte da iniciativa privada que não acreditava no tema do evento e a pior luta, com outros irmãos de cor que não acreditavam no evento. Convidei a revista Raça Brasil e eles nem pra responder ao menos o motico de sua ausência. Não podemos desistir são nas pequenas ações que provamos a nossa determinação.
Aqui em Portugal já estou aprendendo a falar crioulo (língua falada em Angola, São Tomé e Guiné). Em breve estarei falando a língua mesmo.


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